quarta-feira, 6 de junho de 2012

[Literaprosia] Furacão Elis


Furacão Elis é um livro-reportagem. A memória nacional recém-parida, ao vivo e com todas as cores do seu tempo. Toda geração tem, num curto espaço de tempo, que descobrir a sua missão - cumpri-la ou traí-la... Tempo de Elis, do qual somos todos, de certa maneira, apenas sobreviventes. Arrastão, Lunik-9, Upa neguinho, Travessia, Romaria, Madalena, Águas de Março, Retrato em Branco e Preto, Maria, Maria, Dois Pra Lá, Dois Pra Cá, Nas Asas da Panair, Tiro ao Álvaro, Cadeira Vazia, Aquarela do Brasil, Alô, Alô, Marciano. Abaixo a morte, viva a inteligência! O brilho e o gênio da raça, juntos. Tempos de Elis, o Brasil dando risada. Tempos de Elis, o Brasil de Médici ou mude-se. Como também de lá pra cá, até 19 de janeiro de 1982.

Elis Regina era um helicóptero no palco, uma voz de cristal nos festivais, uma peculiar bandeira verde-amarela, um longínquo casarão na Cantareira, briga com garçons em restaurante, um sorriso escancarado, uma tristeza inesperada, e, certo dia, uma surpresa chocante traduzida numa irrealidade cruel: Morte súbita... sei lá... acidente... tragédia... dá pra acreditar? Elis, a elitista, a difícil, a politizada, a inacessível. Ali, no inesperado de uma morte precoce e do sacrifício emblemático, o Brasil cumpria mais do que as obrigações rituais com um ídolo. O inconsciente coletivo mostrava sua sintonia fina com as ondas da MPB: se nossa musicalidade é um fenômeno, Elis Regina era o fenômeno dentro do fenômeno. Clássica, para sempre - nossa Billie Holiday, ou Sarah Vaughan, ou Ella Fitzgerald, não importa a comparação, mas, sim, que seja prestado a Elis o seguro tributo da permanência. Elis Regina não morreu. O país inteiro chorou. Chorou por Elis lágrimas convulsivas, chorou por ele próprio. Se esta biografia toca na corda sensível da dor, já que se fala de um artista, e não há artista que não se submeta aos tormentos agudos da vida, o que prevalece é o brilho, o talento, o vigor, a precocidade, a aventura, o sucesso.

Furacão Elis foi escrito por uma mulher, também Regina. Amigas. Mas apesar disso, a biografia é escrita de maneira imparcial, com trechos de entrevistas colhidas de parentes, próximos e artistas, hoje, consagrados que conviveram com o Furacão. O livro segue uma ordem cronológica, desde o nascimento até a morte inesperada e precoce.

Em minha opinião, a parte final da vida de Elis, contada por Regina Echeverria, deixou a desejar. E explico. Todos sabemos que Elis se envolveu com drogas e que isso acabou sendo o motivo de sua morte. Mas o livro não se aprofunda nessa história. As drogas são citadas, mas o assunto é pouco abordado, talvez porque poucas pessoas soubessem desse envolvimento dela com a cocaína. A morte também é pouco comentada. Ou seja, a vida explosiva de uma mulher difícil de lidar é tratada com certa profundidade, mas os últimos anos de sua vida, desde o começo do envolvimento com as drogas, é superficialmente abordado.

No mais, uma vida tão intensa e uma carreira tão intensa deixaram uma marca indestrutível na cultura do país. Por seus erros, por se descontrolar, por se desentender com os outros e consigo própria, Elis descobriu ao longo da vida o direito de mudar de idéia. Lutou desesperadamente por isso em seus 36 anos. Ela tinha a força dos obstinados. Rompeu com a prudência e se atirou rápida e ágil em seus desejos. Fez e disse o que queria: superou acusações, rótulos, cobranças. Confundiu, anarquizou, gritou e esperneou. Não levou desaforo para casa. Foi uma mutante especialíssima, uma mulher valente, uma artista privilegiadamente
talentosa. Maria, Maria, uma mulher que merece viver e amar como outra qualquer do planeta. Uma dose mais forte, lenta. Oito ou oitenta. Nenhuma diferença. Elis não teve a unanimidade em vida, mas na morte a conseguiu. No palco do Teatro Bandeirantes, onde foi velada, uma platéia respeitosa pôde ver sua fisionomia serena, enfim pacificada.

Ninguém sairá das páginas deste livro ileso ao sentimento de paixão. Hoje posso dizer que respeito muita mais Elis Regina Carvalho Costa e sua magnífica obra. E arrisco-me quando digo que talvez ela tenha nos deixado no momento certo. Talvez sua voz se calasse diante do absurdo que vem se tornando a nossa música.

Um comentário:

  1. vlw so vo copia umas fita prum trabalho de escola!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

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